Monday, October 30, 2006

 

Os media tradicionais e o jornalismo participativo






[1]«Nos últimos cento e cinquenta anos dispusemos essencialmente de dois meios de comunicação: de um para muitos (livros, jornais, rádio, televisão – os media convencionais) e de um para um (cartas, telégrafo e telefone).»
A Internet quando surgiu revolucionou os media tradicionais, «neste momento as comunicações podem ser de muitos para muitos e de alguns para alguns, o que tem vastas implicações para os antigos receptores e para os produtores de notícias, na medida em que a diferença entre as duas categorias começa a tornar-se difícil de estabelecer.»



Para conhecer o jornalismo de hoje Furio Colombo acredita que é necessário explorar as várias faces do Jornalismo contemporâneo:[2]«Por um lado temos os instrumentos e as tecnologias da informação que multiplicam-se com uma rapidez impressionante, por outro, as notícias tornam-se inseguras, quem pode passa por cima dos intermediários e vai falar directamente com as pessoas. Divulga-se a informação apesar de o grande jornalismo escrito e televisivo parecer encaminhar-se para uma crise de deterioração, uma falta de respeitabilidade e de confiança do público.»

Dan Guillmor, em “Nós os Media” avança com uma explicação plausível para a falta de credibilidade nos mass media:[3] «Estou absolutamente convicto de que a moderna estrutura sobre a qual assenta o negócio jornalístico alimentou um conservadorismo que ameaça no nosso futuro. O jornalismo empresarial, que hoje é dominante, está a provocar a diminuição da qualidade para fazer subir os lucros a curto prazo. O que tem o seu lado perverso: tais tácticas poderão acabar por nos destruir. A credibilidade é importante. O público precisa de fontes credíveis, exige-as. - e tais fontes têm sido, na maioria dos casos, os jornalistas sérios.” O conceituado jornalista acrescenta ainda que” As fusões tornam a situação mais ameaçadora. Os grupos de informação estão a fundir-se para formarem grupos cada vez maiores. Em muitos os casos o jornalismo sério – e o serviço público – continua a ser a vítima.»




Os monopólios de informação estão à vista desarmada de todos os cidadãos. Esta não é só uma realidade americana, em Portugal o que dizer dos grandes grupos que englobam em simultâneo revistas, jornais, rádios e canais televisivos? A noção que os media são o 4º poder é bem visível. É inquestionável o poder que os mass media exercem sobre o público, mas com a crescente dinamização da Internet tudo começa a mudar.

Os americanos já há muito questionam a credibilidade das informações transmitidas pelos mass media, mas os portugueses também começam a despertar para esta realidade. O público de hoje está cada vez mais activo na procura de informações. [4]«Ao contrário do que tendencialmente acontece nos ambientes mediáticos tradicionais, o fluxo de informação da Internet não se baseia num modelo de transferência unidireccional.» O que de facto acontecia com os media tradicionais como refere Dan Guillmor: «Os grandes meios de comunicação encaravam a notícia como uma palestra. Nós é que dizíamos como as coisas se tinham passado. O cidadão comprava, ou não comprava.»

Hoje em dia constata-se a participação activa do cidadão no jornalismo, designado jornalismo participativo. O futuro das notícias passa pelas mãos do cidadão, como diz Dan Guillmor: «A produção de notícias e a reportagem do futuro serão mais parecidas com uma troca de ideias ou com um seminário. A linha provisória entre produtores e consumidores vai esbater-se, provocando alterações, que só agora começamos a antever, nos papéis de cada um dos grupos. A própria rede de comunicações será um meio para dar voz a qualquer pessoa, não só àqueles que podem investir milhões de dólares em máquinas impressoras, lançar satélites, ou obter permissão dos governos para utilizarem o espectro visual que é o público.» Em suma: as informações deixaram de ser um mero artigo comercial controlado pelos meios de comunicação social, agora os leitores, os ouvintes e os telespectadores participam activamente na elaboração das notícias.


Como funciona este mundo do jornalismo participativo?


Em Outubro de 2003, Ignacio Ramonet, o Director do Le Monde Diplomatique, desafiou os mass media com a necessidade de criar um quinto poder. Como forma de contrapor a crescente transformação dos meios de comunicação social, em instrumento de acção dos restantes poderes (principalmente do económico – os já mencionados grandes grupos económicos). Este quinto poder tinha como objectivo vigiar os media e preencher as lacunas existentes em termos de informação livre e do pluralismo de opinião. Inclusive Ignacio Ramonet já tinha em mente a criação de um observatório internacional dos media ( Global Media Watch) com o intuito de tornar a comunicação e a informação ao domínio dos cidadãos.

Vital Moreira[5], em 2005 num artigo, no Jornal Público fazia referência a este possível quinto poder designando-o de blogosfera: «Não falta quem já considere a blogosfera como um novo quinto poder, ao lado dos três poderes tradicionais do Estado (poder legislativo, poder executivo, poder judicial) e do quarto poder representado pelos media clássicos. A função dos blogues deveria ser não somente a de fiscalização do estado – função principal dos media numa sociedade aberta – mas também do poder dos media tradicionais, quer quanto à selectividade da sua agenda mediática, quer quanto ao seu tratamento. Daí a invocação que alguns fazem de uma função privilegiada dos blogues em termos de agenda – setting (suscitar temas ignorados pelo poder político e/ou pelos media tradicionais) e de watchdog (função de vigilância e de denuncia dos demais poderes)»



No século XX a notícia era um produto exclusivo dos jornalistas, mas no presente século já não é bem assim. [6]«A tecnologia dotou-nos de um conjunto de ferramentas de comunicação capaz de nos transformar a todos em jornalistas, com custos reduzidos, e em teoria, com acesso a um público global.»


A Internet sem duvida faz parte do dia-a-dia dos portugueses, principalmente dos mais jovens. O próprio Estado português já reconheceu a importância da Internet nas escolas e na sociedade nacional. Quem já não ouviu falar do famigerado “ choque tecnológico”?
Embora um pouco atrasados, como sempre, em relação à Europa estamos no caminho da tecnologia avançada, os blogues são disso exemplo.



No livro “ Online News” de Stuart Allan pode-se de forma simples compreender a importância dos blogues não só no panorama cibernético como na vida das pessoas. Joan Connel (produtor executivo da MSNBC.com) no mesmo livro refere que os blogues surgiram como um veículo de notícias. Qualquer pessoa que tenha algo a dizer e com acesso ao software indicado pode publicar eventos grandes ou pequenos. O blogue surgiu assim como um médium rico com a promessa de transformar o jornalismo até então existente. Os blogues mudaram as notícias na Internet.
[7]«Thanks to blogs, however, everything has changed. Anyone with something to say and acess to the right software can be a publisher, a pundit and a observer of events great and small…»

Os blogues permitem desta forma dar voz a quem não tem tido essa possibilidade. Dan Guillmor acredita que: «A emergência do cidadão-jornalista vai ajudar-nos a prestar-lhes atenção. A possibilidade de qualquer um produzir informação dará voz a pessoas que não a têm tido. E precisamos de ouvir o que elas têm a dizer-nos. Para já, estão a mostrar-nos a todos e cada um de nós – cidadão, jornalista, objecto de notícia – que existem novas formas de falar e de aprender». Este acreditado jornalista defende o equilíbrio entre o jornalismo participativo e o jornalismo convencional.«Procuro um equilíbrio que, simultaneamente, preserve o que o sistema actual tem de melhor e estimule o emergente jornalismo de publicação pessoal, o do futuro.»


Será que o jornalismo convencional aceita de bom grado o chamado jornalismo participativo feito por vulgares cidadãos que desconhecem as regras jornalísticas?


Os blogues podem vir a substituir o jornalismo tradicional?


José Luís Orihuela, professor na Universidade de Navarra e um dos mais reputados investigadores da blogosfera respondeu a estas questões.
[8] «O que está acontecer é uma transformação de meios, uma adaptação a novos tempos. Os meios têm constantemente de se reinventar ou correm o risco desaparecer. Depois da fase da ignorância, seguiu-se a fase do desprezo e desvalorização dos blogues em catástrofes como o Katrina ou o 11 de Setembro, os media tradicionais passaram a temê-los. Neste momento, assistimos à integração de blogues nos próprios órgãos de comunicação social. Neste momento já estamos na fase da canibalização».
De salientar a importância do jornalismo participativo na divulgação de informações destes dois terríveis acontecimentos, acrescentar ainda os atentados de Londres, em que os cidadãos jornalistas tiveram de novo lugar de destaque na divulgação dos acontecimentos através da escrita e das imagens.

O jornalismo tradicional perante este novo jornalismo pode ter duas posições: a da defesa – não reconhece que o jornalismo participativo seja considerado jornalismo, ou então, a da percepção da oportunidade – o acesso à informação com menos custos.
[9] «O jornalismo tem, perante este novo formato, uma de duas posturas: a defesa ou a percepção da oportunidade. A primeira, de pendor(…) corporativo, recolherá a preferência dos que criticam os chamados”jornalistas de pijama”, apontando-lhes a falta de um código de conduta claro, a inexistência de procedimentos de verificação de factos, e a ausência de declaração prévia de intenção. A base da fundamentação assenta na premissa de que qualquer mudança redundará numa maior fragilização do jornalismo e do exercício da actividade.

A segunda postura varia entre a percepção da oportunidade de acesso a mais informação com menos custos e a percepção da oportunidade para flexibilizar o jornalismo. Entre as duas posturas, ou antes delas estará uma outra – a do questionamento aberto dos efeitos, dos problemas e das vantagens resultantes da interacção do jornalismo com novos formatos.»

Pode-se depreender através desta citação que os weblogues podem ser considerados como, os reflexos críticos da actividade jornalística e potenciais fornecedores de informação adicional específica, do que concorrentes em pé de igualdade face aos media tradicionais.

Jay Rosen na reunião BloggerConII em (16.04.2004) não considera que os blogues sejam considerados uma forma de jornalismo mas afirma que: «Blogar não é jornalismo mas enquanto que o jornalismo está na web, o weblogue é profundamente da web, estando os blogueres muito à frente dos jornalistas na percepção das vantagens da web e da sua própria ecologia».




Em traços gerais, J.D.Lasica[10], uma pessoa indubitavelmente reconhecida nesta àrea,
Considera que o jornalismo participativo entra nas seguintes categorias:


1. Participação da audiência e as saídas das notícias populares.
Exemplos: Fóruns de discussão como o New York Times; os artigos escritos pelos leitores; os jornais online nos Estados Unidos e Europa, entre outros.

2. As notícias independentes e os sites de informação da web
Ejemplos: (Gawker, Benicia News, OpinionPleasanton), entre outros.


3. Sites participativos de notícias desenvolvidas
Exemplos: (OhmyNews; citizen-reported news), entre outros.

4. Sites dos media colaboradores e contributários
Exemplos: (Slashdot, Kuro5hin e Metafilter)


5. Outros tipos de thin media

Exemplos: listas de e-mail (Dave Farber?s Interesting-People, Firehair's) newsletters (ThirdAge?s Health Newsletter)


6. Sites de broadcasting pessoais
Exemplos: (Daytonabeach-live.com, KenRadio.com) entre outros.







Steve Outing[11] considera que o jornalismo do cidadão não é um conceito simples que pode ser aplicado universalmente por todas as organizações de notícias. È muito mais complexo, com muitas potenciais variações.


Este autor ensina de uma forma muito simples os onze passos do jornalismo participativo.

I. Abrir ao público comentários (oferece a oportunidade ao leitor de reagir, criticar, elogiar ou acrescentar ao que é publicado por jornalistas profissionais).
Exemplos: ZDNet.com; InsideVC.com




II. O cidadão como repórter (quando o cidadão tem algo a acrescentar à história basta clicar no link respectivo e fazê-lo).



III. Abrir fonte de informação (o termo é entendido geralmente para significar uma colaboração entre jornalista profissional e leitores)
Exemplo: The spokesman-review/APME leitor painel



IV. O bloghouse do cidadão (Hoje quase todos têm um blogue. È uma ferramenta poderosa e acessível e com um longo alcance, onde cada um conta as suas histórias, os seus pensamentos).

Exemplos: NJ.com Weblogs; O poste de Denver Bloghouse, entre outros.



V. Organização de blogues com notícias “transparentes” (é um blogue específico do cidadão que merece a sua própria categoria. È o convite dirigido ao leitor na melhoria contínua da organização das notícias. O leitor pode assim fazer reclamações públicas, críticas ou elogios ao trabalho realizado).
Exemplo: “News Is a Conversation



VI. The stand alone site do jornalismo participativo, versão editada (Um site da web produzido por uma comunidade mas orientado por um editor)
Exemplos: MyMissourian; iBrattleboro.com




VII. The stand alone site do jornalismo participativo, versão não editada (Este modelo é idêntico ao anterior, simplesmente não são editadas as submissões dos cidadãos).
Exemplos: (Backfence.com; GoSkokie)



VIII. Adicionar a edição de impressão
Exemplos: (MyTown; YourHub) entre outros.







IX. O híbrido: a favor do jornalismo do cidadão (Uma organização de notícias que combina o jornalismo do cidadão com o trabalho de profissionais).
Exemplos: (OhmyNews; Bluffton Today) entre outros.




X. Integrating citizen and pro journalism under one roof (um site de notícias da web que inclui relatórios de jornalistas profissionais ao lado de submissões de cidadãos comuns).
Exemplo: Um relatório de um correspondente de uma prefeitura que poderia vir acompanhado de opiniões de cidadãos que fazem um comentário sobre o resultado de um assunto decidido pela assembleia municipal.



XI. Jornalismo de wiki: onde os leitores são editores (o exemplo mais conhecido é o local do WikiNews, uma subsidiária da wikipédia. È um conceito experimental que opera na teoria de que o conhecimento e a inteligência do grupo podem produzir contas de notícias acreditáveis e sensatas.




A única forma de conhecer o jornalismo de amanhã é entender as tecnologias que neste momento estão a torná-lo possível. As ferramentas do jornalismo participativo do futuro estão a evoluir a uma grande velocidade. Desde a mais simples lista de e-mail, aos blogues, aos jornais escritos em ordem cronológica inversa, até aos instrumentos portáteis, como: os telemóveis, os computadores móveis de dimensões reduzidas (PDA), entre outros.

No presente sabemos que sites como:

Ohmynews (ciberjornal sul – coreano fundado em 2000, em que o seu fundador Oh Jeon Ho afirmava: “ Todo o cidadão é um repórter”. Este site neste momento tem 40 000 colaboradores, um número que mostra bem a importância do jornalismo participativo na actualidade).
E

Independent Media Center ou Indymedia (rede internacional de produtores de informação livre e independente. Produz jornais, áudio, e video- jornalismo).

Estão marcados pelo sucesso, resta agora saber qual o futuro do jornalismo tradicional!


Earl Wilkinson[12], director da INMA [International Newspaper Marketing Association], apresentou nove perspectivas do que serão os jornais num futuro próximo. Seis delas estão intimamente relacionadas com a Internet:

O jornalismo de investigação e mais rico vai mudar-se para a Internet;

A procura dos conteúdos será personalizada e interactiva;

As opções digitais vão multiplicar-se: o jornal disponível a qualquer hora, em qualquer lugar, em qualquer plataforma;

Os jornais permitirão a compra dos artigos em separado;

Os leitores assinarão versão multimédia e não versões impressas;

O jornalismo do cidadão será uma fonte de notícias como a Reuters ou a AP




Dicas:

Vídeo sobre o futuro do jornalismo. Para quem ainda não assistiu: está disponível no Google um vídeo em que Vint Cerf, Dan Guillmor, entre outros, debatem o futuro do jornalismo. O vídeo é de 27 de Julho de 2005.

Documentário do jornalismo de participação, o assunto está em debate na lista do Intermezzo.



O filme “Minority Report” dá muitas ideias: o jornal em papel electrónico por exemplo.






Notas de referência:

[1] Guillmor, Dan “ Nós os Media”, pág. 42

[2] Colombo, Furio :”Conhecer o Jornalismo Hoje” pág.9

[3] Guillmor, Dan em: “ Nós os Media”, págs.15,16, 17,18

4 http://www.cibersociedad.net/congres2004/grups/grup.php?idioma=es&id=19

[5] Jornal Público, terça-feira, 23 de Agosto de 2005

[6] Guillmor, Dan: “ Nós os Media”, pág. 14

[7] Stuart Allan, “Online News”, pág.121

[8] http://expresso.clix.pt/Actualidade/Interior.aspx?content_id=370751

[9] http://www.cibersociedad.net/congres2004/grups/grup.php?idioma=es&id=19


[10] http://www.ojr.org/ojr/workplace/1060217106.php

[11] http://www.poynter.org/content/content_view.asp?id=83126

[12] http://weblogger.wordpress.com/2006/10/02/os-jornais-de-amanha/



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Comments:
[OFF TOPIC]
Bom dia. Saíu a LISTA.
[http://weblogger.wordpress.com/2006/11/09/203/]
Divulguem.
Abraços,
CT
 
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